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As Escrituras não nos dizem muito acerca deste homem, e nem sequer conhecemos o seu nome. Sabemos que, trinta e oito anos antes, fora acometido por uma enfermidade que o tornara paralítico, confinando-o ao leito. Sabemos também que buscara a solução para o seu grave problema no Tanque de Betesda (onde, sempre que as águas eram agitadas por um anjo, o primeiro enfermo que descesse às mesmas era imediatamente curado) e ainda que não tinha ninguém que o ajudasse (cf. João 5:2-7). Em concreto, mais não sabemos.

 

Talvez nunca tivesse tido quem o introduzisse no tanque. Porém, tendo em conta que vivia numa sociedade em que os laços entre as pessoas eram mais fortes que naquela em que vivemos hoje e também que as suas possibilidades de cura dependiam da celeridade com que entrasse na água, é mais provável que os seus familiares e amigos o tivessem inicialmente ajudado, na esperança de verem a sua saúde rapidamente restaurada.

 

Todavia, a realidade – como tantas vezes acontece neste mundo – veio a revelar-se bem diferente do antecipado e, cada vez que a água era agitada, havia sempre alguém que era lá introduzido primeiro. De tal forma que, com o passar dos meses e dos anos, provavelmente alguns dos que o auxiliavam, devido aos seus afazeres, deixaram de ter tempo para ele e outros começaram a cansar-se da falta de sucesso dos seus esforços, dos eventuais queixumes e lamentos do paralítico e, mais tarde, da sua revolta amarga, e deixaram de vir… Quando, finalmente, os seus familiares mais próximos morreram, o homem ter-se-á visto completamente entregue a si próprio.

 

É certo que, sempre que a água era agitada, ainda tentava arrastar-se o melhor que podia até à borda do tanque. Porém, fazia-o apenas num derradeiro impulso de sobrevivência, sabendo, no fundo, que todos os seus esforços eram em vão.

 

Compreensivelmente, a apatia e o desânimo ter-se-ão apoderado dele e estes sentimentos ir-se-iam agravando cada vez mais, à medida que, com o passar dos anos, assistia aos sucessivos milagres da cura de outros…

 

Todavia, algo de inesperado veio a acontecer!

 

Era dia de festa religiosa em Jerusalém. As multidões convergiam para ali e com elas caminhava alguém especial. Alguém que, ao chegar à Cidade Santa, inusitadamente, ao invés de se dirigir para o Templo, se afasta da corrente de gente e se encaminha para o Tanque de Betesda.

 

Que procura ele ali num dia de festa? Não sabe ele que nos alpendres daquele tanque não há nada de interesse, não há nada para além de um grande número de “cegos, coxos e paralíticos” (João 5:3)? Não se terá ele equivocado?

 

Não, não se equivocou. Foi um coração cheio de compaixão que conduziu Jesus àquele lugar, quando todos os outros buscavam a festa do Templo. Mas não era esta festa realizada para honrar a Deus? Certamente que sim. Porém, sem o suspeitar, uma alma só, abandonada por todos e no fim das suas forças, estava ali à espera de ser curada e salva – e isso era igualmente importante…

 

Queres ficar são?” (João 5:6) – perguntou Jesus ao paralítico. Este talvez tenha estremecido, habituado, como certamente estava, a que todos o ignorassem. Embora pressentisse que quem lhe dirigia a palavra era alguém fora do comum, respondeu-lhe de acordo com a realidade que conhecia: “Senhor, não tenho homem algum que, quando a água é agitada, me coloque no tanque” (João 5:7).

 

Todavia, o Criador do Universo não necessitava de tais métodos para restaurar um corpo arruinado à mais perfeita saúde, e bastaram as palavras cheias de poder e autoridade: “Levanta-te, toma a tua cama e anda” (João 5:8), para que o homem ficasse são e partisse, transportando o seu leito.

 

Vivemos numa sociedade que valoriza o bem-estar, o vigor e o sucesso acima de tudo, e para a qual qualquer forma de sofrimento, debilidade ou fracasso deve ser evitada a todo o custo. Infelizmente, os filhos de Deus não deixam de ser influenciados por esta mentalidade e de buscar as “festas”, os cultos e os ajuntamentos especiais (embora legítimos e necessários), bem mais que os “tanques de Betesda”, dentro e fora da igreja, onde jazem aqueles que, quando não são fisicamente “cegos, coxos e paralíticos”, o são emocionalmente ou espiritualmente. E muitos deles já passaram, ou estão a passar, por um doloroso processo de perda ou de abandono por parte daqueles que foram, ou são, importantes nas suas vidas, experimentando uma solidão cada vez mais profunda, conducente à apatia, à amargura ou ao desespero.

 

Como foi diferente o exemplo de Jesus… Betesda, em hebraico, significa “casa de misericórdia” – e foi este o lugar que ele buscou, antes de se dirigir ao Templo da adoração (cf. João 5:14).

 

A religião pura e imaculada para com Deus, o Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e guardar-se da corrupção do mundo.” (Tiago 1:27)

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