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Ao longo da sua vida, aquela mulher tinha visto levantarem-se à sua volta espessos muros de desprezo e preconceito. A sua condição de mulher, numa sociedade marcadamente patriarcal, colocara-a, logo à nascença, em desvantagem em relação ao sexo forte, transformando-a num ser de segunda classe.

 

À medida que crescia, foi-se dando conta de que, como samaritana, era desdenhada pelos judeus, que consideravam inferiores, tanto a sua raça, como a sua religião. De facto, os judeus desprezavam os samaritanos, por um lado, porque eram fruto da mistura de israelitas pobres (que tinham permanecido na Palestina quando as dez tribos do reino de Israel foram levadas para a Assíria) com povos trazidos para a Terra Santa pelos assírios, e, por outro lado, porque a sua religião, embora inspirada no judaísmo, divergia dele em vários aspectos.

 

Também em relação à sua vida pessoal e social, a samaritana foi pouco feliz, tendo, ao longo dos anos, casado, nada mais, nada menos, que cinco vezes. Não sabemos ao certo se o fez na sequência de viuvezes ou de divórcios. Porém, não é difícil adivinhar que, com cada novo casamento, ela foi perdendo valor aos olhos de familiares e vizinhos. E isto agravou-se ainda mais quando, por fim, aceitou viver com um homem com quem nem sequer tinha casado…

 

Com esta história de vida, pouco mais restou àquela mulher que resignar-se à sua condição de desprezada, aceitando uma existência sem horizontes e sem sentido, preenchida praticamente apenas com as entediantes rotinas do dia-a-dia.

 

E foi exactamente neste ponto que Jesus decidiu marcar um encontro com ela, no cenário familiar do poço de Jacó, onde todos os dias ia tirar a água necessária à sua sobrevivência.

 

Ao aproximar-se e ao avistá-Lo sentado junto àquele poço, estava longe de imaginar que, naquele dia, a sua vida iria sofrer uma mudança radical. E tudo começou com palavras bem curtas e simples: “Dá-me de beber.” (João 4:7)

 

Aos olhos de um leitor do século XXI, este será um pedido banal. Porém, na Palestina do primeiro século da nossa era, as singelas palavras de Jesus derrubaram todos os muros de preconceito que mantinham aquela mulher aprisionada.

 

Quando regressaram, algum tempo mais tarde, da cidade de Sicar, onde tinham ido comprar comida, os discípulos deram-se bem conta de que Jesus derrubara o muro da discriminação sexual: “E nisto vieram os seus discípulos, e maravilharam-se de que estivesse falando com uma mulher” (João 4:27).

 

Ao ouvir as palavras de Jesus, a samaritana apercebeu-se com surpresa que Ele tinha derrubado igualmente o muro do preconceito racial: “Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana?” A isto, acrescentou o apóstolo João: “Porque os judeus não se comunicam com os samaritanos.” (João 4:9)

 

Finalmente, Jesus derrubou o muro do preconceito social, porque, apesar de na Sua divindade ser conhecedor da situação pessoal daquela mulher, não deixou de dialogar com ela.

 

Mas o que acabamos de descrever foi apenas o começo da obra de graça que o Filho de Deus produziu naquela vida. Ainda algo abalada e mal habituada a um valor pessoal inesperadamente readquirido, a samaritana vê-se envolvida num diálogo que lhe abre horizontes insuspeitos.

 

É desta forma que um simples pedido de água, que satisfaz temporariamente uma necessidade física, serve de pretexto à introdução do tema maior da satisfação da sede espiritual da alma: “Qualquer que beber desta água tornará a ter sede; mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede, porque a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água que salte para a vida eterna.” (João 4:13-14)

 

E a solicitação de Jesus, no sentido de ela ir chamar o seu marido, dá-Lhe a ocasião de se revelar na Sua dimensão profética, descrevendo de forma precisa a sua situação pessoal, e preparando, deste modo, o seu coração para a revelação suprema:

 

“A mulher disse-lhe: Eu sei que o Messias (que se chama o Cristo) vem; quando ele vier, nos anunciará tudo. Jesus disse-lhe: Eu o sou, eu, que falo contigo.” (João 4:25-26)

 

É nesta altura que a graça de Deus opera o primeiro milagre do dia, conferindo à samaritana a fé redentora no Filho de Deus. O segundo milagre dá-se logo em seguida, quando aquela que era desprezada por todos se transforma em instrumento de salvação e, abandonando o cântaro das suas preocupações pessoais, corre à sua cidade, chamando os seus conterrâneos, para que venham a Jesus. E a Palavra relata que muitos creram, em consequência do testemunho daquela mulher.

 

“Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes; e Deus escolheu as coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para aniquilar as que são; para que nenhuma carne se glorie perante Ele.” (1 Coríntios 1:27-29)

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