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João Baptista foi um homem excepcional. Jesus Cristo referiu-se a ele, dizendo que "entre os que de mulher têm nascido, não apareceu alguém maior do que João Baptista" (Mateus 11:11). E não podia ser de outro modo, porque ele foi o escolhido de Deus para preparar o caminho de Seu Filho.

 

Como sucedera no passado com as mães de outros grandes homens de Deus (Isaque, Jacó, José, Samuel), Isabel, a mãe de João Baptista, era estéril. Tanto ela como o seu marido, o sacerdote Zacarias, eram de idade avançada, mas também eram piedosos e dedicados a Deus. Um dia, quando coube a Zacarias a vez de entrar no Templo para oferecer o incenso, o anjo Gabriel apareceu-lhe e anunciou-lhe que, em resposta às suas orações, se daria o milagre do nascimento de um filho. Este, de acordo com as palavras do anjo, seria invulgar:

 

"Porque será grande diante do Senhor, (...) e será cheio do Espírito Santo, já desde o ventre de sua mãe. E converterá muitos dos filhos de Israel ao Senhor, seu Deus" (Lucas 1:15-16).

 

De facto, a plenitude do Espírito foi uma marca particular da vida de João Baptista desde a sua concepção, e o ocorrido na visita de Maria, mãe de Jesus, a Isabel, sua prima, ilustra este facto de uma forma tocante:

 

"E aconteceu que, ao ouvir Isabel a saudação de Maria, a criancinha saltou no seu ventre; e Isabel foi cheia do Espírito Santo, e exclamou com grande voz, e disse: Bendita és tu entre as mulheres, e é bendito o fruto do teu ventre!" (Lucas 1:41-42)

 

O Espírito, que enchia o pequeno João na barriga de sua mãe, contagiou-a e levou-a a anunciar o Salvador. Deste modo único, a missão de João Baptista teve o seu início ainda antes do seu nascimento, e foi através de um cântico de seu pai, Zacarias, que o mesmo Espírito a revelou em toda a clareza:

 

"E tu, ó menino, serás chamado profeta do Altíssimo, porque hás-de ir ante a face do Senhor, a preparar os seus caminhos, para dar ao seu povo conhecimento da salvação, na remissão dos seus pecados" (Lucas 1:76-77).

 

João Baptista foi, de facto, um homem singular, e, como o Espírito de Deus teve uma influência muito forte na sua vida, podemos certamente receber lições importantes a partir dela.

 

Comunhão

 

Sendo a missão de João Baptista tão especial, a sua preparação tinha também de ser incomum: "E o menino crescia, e se robustecia em espírito, e esteve nos desertos até ao dia em que havia de mostrar-se a Israel." (Lucas 1:80)

 

O pequeno João não frequentou uma escola religiosa, antes foi guiado para o deserto, para ali escutar a voz do Senhor em primeira mão e, assim, preparar-se para o seu ministério e para os combates que iria ter de travar.

 

O segredo da santidade e do poder revelados por João Baptista residia, deste modo, não exclusivamente na plenitude do Espírito Santo, mas também numa comunhão intensa e constante com o seu Deus. Aliás, ambos os aspectos se complementam, já que quem está cheio do Espírito tem sede do Senhor, buscando a Sua presença, e quem quer obter a plenitude do mesmo Espírito só o consegue andando perto de Deus.

 

Possivelmente como reflexo da sociedade em que vivemos, na qual se enaltece a acção e o desempenho, no nosso meio tem-se vindo a enfatizar a importância do serviço cristão, do trabalho na obra de Deus. E é um facto que as Escrituras nos falam desta necessidade ("servi-vos uns aos outros pelo amor" - Gálatas 5:13). Mas elas também nos dizem que devemos buscar uma comunhão íntima e regular com Deus: "Quando tu disseste: Buscai o meu rosto, o meu coração te disse a ti: O teu rosto, Senhor, buscarei." (Salmo 27:8)

 

Nunca alcançaremos a santidade pessoal e o poder no ministério se não nos expusermos diariamente à luz e ao calor do “deserto” da comunhão com Deus, onde, sem nos distrairmos com o que não é essencial, podemos falar com Ele através da oração e escutar a Sua voz por meio da Sua Palavra.

 

 

Simplicidade

 

"Sim, que fostes ver? Um homem ricamente vestido? Os que se trajam ricamente estão nas casas dos reis" (Mateus 11:8). Foi Jesus quem, dirigindo-se a uma multidão, se pronunciou deste modo acerca de João Baptista. Noutra passagem lemos: "E este João tinha a sua veste de pêlos de camelo e um cinto de couro em torno de seus lombos e alimentava-se de gafanhotos e de mel silvestre." (Mateus 3:4)

 

Apesar de ter por missão anunciar o Messias, o Rei dos Reis, a preocupação de João Baptista com a sua aparência e com a sua alimentação não podia ser menor. Sendo ele cheio do Espírito Santo logo desde o momento em que foi concebido, o seu coração tinha pouco espaço para as coisas terrenas. Tudo o que era material era, para ele, também irrelevante: o seu ser estava totalmente absorvido pelo que era espiritual.

 

A Palavra de Deus é clara, ao indicar-nos um estilo de vida caracterizado pela simplicidade como aquele a seguir:

 

“Mas é grande ganho a piedade com contentamento. Porque nada trouxemos para este mundo e manifesto é que nada podemos levar dele. Tendo, porém, sustento e com que nos cobrirmos, estejamos com isso contentes. Mas os que querem ser ricos caem em tentação, e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína. Porque o amor do dinheiro é a raiz de toda a espécie de males” (1 Timóteo 6:6-10).

 

Embora não tenhamos necessariamente de ser tão frugais, ou mesmo ascéticos, como João Baptista, sendo legítimo buscar algum conforto enquanto vivermos neste mundo, o enriquecimento material como objectivo de vida é-nos claramente vedado na passagem que acabamos de citar. As riquezas que Deus pretende que acumulemos são de outra ordem: “Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam. Mas ajuntai tesouros no céu” (Mateus 6:19-20).

 

E se o Senhor, através da nossa actividade profissional ou por qualquer outro meio, nos conceder mais recursos materiais que os necessários para assegurarmos uma subsistência com dignidade, oferecer-nos-á, ao mesmo tempo, a possibilidade de os partilharmos com pessoas necessitadas ou de os investirmos na Sua obra. Desta forma, os “tesouros na terra” poderão ser convertidos em duradouros “tesouros no céu”.

 

 

Verdade

 

Escrevendo aos efésios, o apóstolo Paulo sublinhou que "o fruto do Espírito está em toda a bondade, e justiça, e verdade" (Efésios 5:9). Assim, sendo a plenitude daquele Espírito uma característica particular da vida de João Baptista, o seu ministério tinha de ser marcado pela verdade, e por uma verdade em toda a sua clareza e sem qualquer preocupação com o risco pessoal que poderia resultar da sua exposição.

 

Foi deste modo que, quando elementos das seitas dos fariseus e dos saduceus foram observar o baptismo que praticava no Jordão, ele se dirigiu a eles de forma dura e contundente:

 

"Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira futura? Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento e não presumais de vós mesmos, dizendo: Temos por pai a Abraão" (Mateus 3:7-9).

 

A dureza das palavras de João Baptista não era, porém, gratuita, antes ele procurava abalar, com a verdade nua e crua, as consciências cauterizadas daqueles homens religiosos que pensavam conseguir chegar a Deus com base na sua ascendência e na sua justiça própria, sem uma verdadeira conversão interior.

 

João dispôs-se de tal forma a expor a verdade que isto acabou por lhe custar a própria vida. Numa época em que os governantes eram duros e implacáveis, ele não hesitou em dizer a Herodes, que se tinha apropriado da mulher do seu próprio irmão: "Não te é lícito possuí-la" (Mateus 14:4). O resultado desta audácia foi a sua prisão e, mais tarde, a sua execução, tendo a sua cabeça sido entregue à adúltera num prato…

 

O exemplo de João Baptista dá-nos a oportunidade de reflectirmos sobre o nosso grau de aderência à verdade, em todos os aspectos da vida. A mentira não é a única forma através da qual alguém se pode distanciar da verdade: também o pode fazer quando a manipula ou quando a omite, calando-se quando deve falar.

 

João demonstrou, como vimos, uma grande fidelidade à verdade. Mas o Único que revelou um grau de aderência total à mesma foi Jesus Cristo. De facto, Ele corporizou-a: “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida.” (João 14:6)

 

O Filho de Deus foi capaz disto porque n’Ele não havia sombra de pecado e, consequentemente, não existia qualquer egoísmo. Se formos sinceros, são exactamente o egoísmo e a atitude de auto-preservação, a ele intimamente ligada, que nos impedem de aderirmos à verdade de um modo mais intenso. Sabemos perfeitamente que esta aderência implica sacrifício e sofrimento no relacionamento com o outro, algo que a nossa natureza decaída sempre procura evitar.

 

A única forma de crescermos nesta área é darmos espaço, nas nossas vidas, ao Espírito Santo, que sempre procura levar-nos para mais perto d’Aquele que é a verdade.

 

 

Humildade

"É necessário que ele cresça e que eu diminua" (João 3:30). Se quisermos resumir a vida de João Baptista a uma frase, esta, que ele pronunciou acerca do Filho de Deus e de si próprio, é a indicada. Nenhuma outra expressão seria de esperar de uma pessoa cheia do Espírito, porque o trabalho que este quer fazer em cada um de nós é exactamente o de nos ensinar a esvaziarmo-nos progressivamente de um ego desfigurado pelo orgulho e pelo egoísmo, para deixarmos a beleza de Cristo transparecer cada vez mais nas nossas vidas.

 

Se houve algum homem nas Escrituras que podia vangloriar-se da missão que lhe tinha sido confiada e da obra que tinha realizado, esse homem era João Baptista. No entanto, tendo a sua vida centrada na pessoa do Messias, ele limitou-se certamente a juntar a sua voz às dos que disseram: “Somos servos inúteis, porque fizemos somente o que devíamos fazer.” (Lucas 17:10)

 

Não obstante a sua excepcionalidade, João era humano e falhava como qualquer um de nós. Deus revelou-lhe quem era o Seu Filho de uma forma singular, que é narrada pelo próprio da seguinte maneira:

 

"Eu vi o Espírito descer do céu como uma pomba e repousar sobre ele. E eu não o conhecia, mas o que me mandou a baptizar com água, esse me disse: Sobre aquele que vires descer o Espírito e sobre ele repousar, esse é o que baptiza com o Espírito Santo. E eu vi e tenho testificado que este é o Filho de Deus." (João 1:32-34)

 

Apesar disto, mais tarde, no cárcere de Herodes, assaltado pelas dúvidas semeadas pelo Inimigo na sua mente, ele envia dois dos seus discípulos a Jesus com a pergunta: "És tu aquele que havia de vir ou esperamos outro?" (Mateus 11:3)

 

Cada vez que cairmos, precisamos de lembrar-nos de que, na verdade, não passamos de vasos de barro que necessitam de ser moldados por Jesus à Sua imagem. E não devemos esquecer-nos de que Ele só poderá fazer isto se assumirmos a atitude de humildade de João Baptista, demonstrada por ele de forma singela, ao dizer, a respeito do Senhor: "do qual eu não sou digno de desatar as correias das sandálias." (João 1:27)

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