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Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?” (Mateus 27:46)

 

O silêncio de Deus, o aparente silêncio de Deus em momentos de dor e sofrimento, é um dos principais motivos de angústia dos seres humanos e principalmente dos crentes.

 

A Bíblia, sendo um livro profundamente franco e realista, não esconde esta inquietação, que remonta aos primórdios da história humana. No livro de Jó encontramos ecos deste sentimento: “Ainda que chamasse, e ele me respondesse, nem por isso creria que desse ouvidos à minha voz” (9:16). No Salmo 22, que descreve a perseguição injusta e cruel de um homem inocente, David suplica (vs. 1-2), “Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste? Por que te alongas das palavras do meu bramido, e não me auxilias? Deus meu, eu clamo de dia, e tu não me ouves; de noite, e não tenho sossego.

 

O clamor de Jesus registado em Mateus 27:46, “Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?”, em que as palavras iniciais do Salmo 22 foram citadas pelo Senhor, reflete uma outra realidade. Jesus Cristo, sendo Deus e Homem mas sem pecado, nunca experimentou em algum momento da sua curta existência terrena uma interrupção da comunhão que desfrutava com Deus Pai desde o princípio.

 

O diálogo íntimo e constante que Jesus mantinha com Deus Pai, e que em algumas alturas foi presenciado por outras pessoas, como por exemplo no batismo de Jesus ou na ressurreição de Lázaro, foi quebrado neste momento crucial da História em que o Senhor, na cruz, tomou sobre si o nosso pecado.

 

Jesus Cristo, por amor a nós, abdicou dolorosamente na cruz da comunhão que tinha com Deus para que, através d’Ele, nós pudéssemos ter também acesso à comunhão com Deus Pai de um modo pessoal e íntimo, de filho para pai, que irá continuar por toda a eternidade. Além do sofrimento físico atroz, Cristo experimentou o sofrimento espiritual resultante da separação e afastamento de Deus. Nesta ocasião de profunda angústia e desespero, o Senhor proferiu as palavras de David, “Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?” (Salmo 22:1), não porque desconhecesse a razão desse aparente abandono e silêncio de Deus, mas porque foi assim que o salmista as declarou. Jesus citou este texto das Escrituras como citou outros ao longo da sua vida, para que todos soubessem que Ele era o Messias prometido que veio cumprir as profecias.

 

O facto de o véu do templo (que separava o lugar santo do santo dos santos e onde só o sumo-sacerdote podia entrar uma vez por ano) se ter rasgado de alto a baixo neste momento, sem intervenção humana, foi o sinal visível do êxito da missão de Jesus de reconciliação do ser humano com Deus e de vitória sobre o pecado e as forças do mal.

 

Jesus Cristo, Deus feito Homem, é a resposta mais completa ao aparente silêncio de Deus. A Sua missão suprema foi morrer numa cruz romana em nosso lugar para que, pela fé em Jesus e no Seu sacrifício, pudéssemos ser resgatados do reino das trevas e da morte para uma vida com propósito. Jesus exclamou “Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?”, para que cada um de nós possa experimentar em cada dia a presença, o consolo e a direção de Deus, que irá continuar por toda a eternidade. Podemos por isso dizer, com os santos e os anjos, “Digno é o Cordeiro, que foi morto, de receber o poder, e riquezas, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e ações de graças” (Apocalipse 5:12). Ámen.

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