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Muito recentemente soubemos que a Lilian e os nossos dois netos (Lucas, com 5 anos e Lourenço com 2) e o Ricardo tinham ido rever a casinha em Coimbra onde passaram a sua infância. Viram que uma nespereira que estava à frente da casa já não existe! Pelo resto, o aspeto exterior da casa (nas fotos que nos mandaram) não tinha mudado muito. Aproveitaram uma viagem de trabalho que o nosso genro, Luís, tinha até Miranda do Corvo. A visita deles ao Portugal dos Pequenitos também foi marcante para o Lucas e o Lourenço – como costuma ser para todas as crianças.

 

Conheci pela primeira vez a casa, arrendada pelo pai da Celeste, em 1976. Acabava de chegar a Portugal pela primeira vez. Depois de umas horas passadas por engano em Pombal (porque tinha recebido informações erradas sobre a hora de chegada do comboio que me trazia de Salamanca a Coimbra), cheguei à casa humilde em que a Celeste e a Isabel (ver Retalho I.) viviam. O seu pai tinha casado em segundas núpcias e vivia em outra casa, um pouco fora da cidade. Eu tinha conhecido a Celeste na Áustria (ver Retalho C), mas não mantivera contacto com ela ao longo de três anos que vivi e trabalhei com o GBU em Espanha.

 

A casa tinha sido a última de várias em que vivera a família da Celeste e era nela que moravam quando a sua mãe faleceu.

 

Era simples e acolhedora. Tinha duas divisões e uma cave em baixo – com alçapão e uma escada íngreme a subir até à cozinha, no r/chão tinha mais três divisões e um pequeno terraço atrás, por onde se entrava numa pequena casa de banho obviamente acrescentada. E era essa casa a base principal (mais tarde a sede nacional!) do GBUP – ver Retalho G.

 

Após o nosso casamento, em 3 de setembro de 1977 (em breve devemos celebrar os nossos 40 anos!), ficámos a viver na casa com a Isabel, adolescente, ocupando o quarto em baixo. Para nos podermos deslocar até à baixa da cidade ou até a universidade, tínhamos o elétrico, n.º 3, ou o trólei, n.º 8. Raras vezes descemos até ao fundo da Rua da Mãozinha: era praticamente um beco sem saída, com descida muito íngreme, a começar pouco depois da nossa casa. A renda da casa era antiga (creio que era 500 escudos na altura).

 

E aí se desenvolveu o trabalho do GBU – também com o uso de salas da Igreja Baptista e de bares nas Faculdades e, quando era preciso ou possível, salas solicitadas na Universidade ou na Associação Académica. Também servia para as reuniões a nível nacional – de conselheiros e Direção Nacional (estudantil). A pequena cave serviu para instalar o primeiro duplicador do GBU – e, assim, era daí que saía o boletim do GBU, depois chamado «Razão de Ser».

 

De 1982 a 1985, vivemos em Lisboa, na sede que foi comprada pela IFES (GBU internacional) para o trabalho, perto do Jardim Constantino. Nesse período já tínhamos dois filhos – Ricardo e John – e a Lilian nasceu em julho de 1983. Mas nasceu em Coimbra, no período do verão – era lá que nos sentíamos em casa! Depois, em junho de 1985, nasceu o Andrew, também em Coimbra!

 

Foi nessa altura que deixámos a liderança do movimento e, naturalmente, a residência na sua sede. Eu tinha de procurar trabalho em Coimbra. A única hipótese era tentar arranjar um trabalho como professor de inglês (acontece que houve abertura no British Council, situação essa que era bastante melhor do que normalmente se poderia esperar nas circunstâncias). E queríamos arranjar uma casa de renda na zona. Nessa altura a Isabel tinha mudado de casa e o pai da Celeste tinha enviuvado e estava a morar novamente na Rua da Mãozinha, n.º 12. Para nossa surpresa – e grande alívio! - convidou-nos para partilharmos a casa com ele e ele foi uma ajuda preciosa a todos os níveis. Algum tempo depois, veio a casar de novo e foi viver noutro lugar.

 

A casa de facto era pequena para uma família de seis a morar com um avô! Mas, com ajuda dos meus pais, foi possível adquirirmos uma casinha pré-fabricada com duas divisões, que se colocou no fundo do quintal. Depois, como o cuidar de três crianças muito pequenas (mesmo com o apoio do Ricardo, que já era um pouco menos pequeno) era demasiado difícil para a Celeste, recebemos uma jovem angolana, Luísa, que estudava e ajudava em part-time, vivendo numa das divisões da casinha no fundo do quintal.

 

Tínhamos deixado o GBU, mas o GBU não nos deixava! Aos domingos víamos vários estudantes do GBU no culto da Igreja Baptista. Lá também encontrámos missionários que vinham para aprender a língua, muitos deles em preparação para o trabalho na Guiné-Bissau. Tornou-se nosso hábito convidar nos domingos esses estudantes, portugueses e estrangeiros. Chegámos a ter duas salinhas e a cozinha a funcionar para alguns destes almoços de domingo! Assim, o nosso bom amigo Quim Rogério, que tirava o curso de Direito, frequentou a casa. E como evangelizava os seus colegas na Faculdade, combinava comigo para ir falar com eles, para responder a questões apologéticas que pudessem levantar.

 

Na altura vivia e trabalhava em Coimbra o casal Oivind e Tone Benestad, obreiros noruegueses, experientes e sábios, que também davam grande apoio a estudantes entusiastas como o Quim – e mesmo a outros que precisavam de muito encorajamento para começarem a evangelizar.

 

Nos períodos trabalhosos das “fraldas e biberões” dos nossos filhos lavagem de fraldas (na altura as fraldas descartáveis eram extremamente caras!), tivemos a ajuda de uma senhora moçambicana, membro da nossa igreja, D. Angelina Moreira, que teve o prazer de nos ajudar de muitas outras maneiras também.

 

Em 1988 a minha mãe, já viúva e a viver sozinha na nossa aldeia no norte da Inglaterra, decidiu comprar um apartamento em Coimbra, que ficava a uns dez minutos a pé da Rua da Mãozinha. Anteriormente tinha passado alguns meses connosco na sede do GBU em Lisboa, mas agora a situação era claramente melhor para ela, permitindo-lhe alguma independência. Ficámos admirados com a capacidade dela de comunicar nas lojas (onde nem as pessoas falavam inglês nem ela português). Comunicava também bastante com os netos e, embora não se tenha sentido à vontade para fazer serviço de «baby-sitter», convidava os mais velhinhos para a visitarem em casa – visitas essas de que eles guardam as melhores memorias!

 

O tempo que ela teve perto de nós foi pouco. Foi-lhe diagnosticado, no princípio de 1989, um cancro no ovário, de que veio a falecer em abril do mesmo ano, com apenas 67 anos. Os tratamentos de quimioterapia na altura eram muito severos e desgastantes (uma das enfermeiras que os ministrava confessou-nos que, se fosse ela, nunca quereria tentar prolongar a vida de familiares seus com tais tratamentos). Mas a minha mãe, como familiar nosso, recebeu as consultas e tratamentos necessários gratuitamente, e beneficiou dos serviços do novo Hospital da Universidade de Coimbra. E, apesar de ela ser uma pessoa de temperamento nervoso, deixou-nos numa atitude de paz e confiança no Senhor que nos consolou bastante.

 

Assim os nossos filhos, além de experimentarem a alegria de ser família - e a confusão de uma família grande numa casa pequena, em que os pais queriam ser hospitaleiros - viram de perto o problema da doença terminal e da morte.

 

Na Escola Primária dos Olivais, na curva onde se apanhavam os elétricos e os tróleis, estudaram o Ricardo, o John e a Lilian. O Ricardo veio depois a estudar no Ciclo Preparatório, em Celas, um pouco mais longe de casa. No princípio das aulas a Lilian sofreu uma crise de adaptação à Escola e o John, que tinha apenas mais 18 meses do que ela, ofereceu-se para ir ficar com ela nas aulas durante uma semana para dar apoio (tendência «pastoral» que o John depois veio a cultivar de outras maneiras também!).

 

Para as idas à igreja eram uns 2 kms. de elétrico ou trólei e havia horários. Não era fácil preparar uma família assim para essas idas, mas eles beneficiavam muito da vida da igreja e do ministério da APEC (Aliança Pró-Evangelização de Crianças) e fizeram boas amizades. O John, inclusive, chegou a professar a sua fé em Cristo e a ser batizado nessa fase pelo Pastor Daniel Machado. Um pouco mais tarde o Ricardo também professou a sua fé e foi batizado.

 

Foi também nessa fase que começámos a visitar Cantanhede, onde tivemos uma parte na organização da nova missão e onde o nosso “apetite” foi aberto para entrar numa nova fase de ministério pastoral, que começou em julho de 1991.

 

E foi assim que deixámos a Rua da Mãozinha, n.º 12, casa que durante todos esses anos fez parte, de uma forma indelével, da nossa história familiar! Depois, em Caldas da Rainha, vivemos poucos meses num andar moderno na cidade. Foi com grande alívio que mudámos para uma pequena casa térrea (mas não tão pequena como a da Rua da Mãozinha). Aí se juntou a nós a “vovó Angelina” que também fazia parte da nossa família e já não podia subir escadas. Ficava no limite extremo da cidade, e também era boa para criar filhos, velha e acolhedora, algo parecida com a casa em Coimbra!

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